Amanheceu. Esticando o braço para desligar o despertador do celular que, a essa altura, acordava a casa toda, ele sabia que o dia havia começado. Chinelos, banheiro, café, roupas, mochila...rotina. O ônibus já fazia seu som ao longe, ele sabia que era o momento de correr ou se atrasaria e terminaria por perder o transporte. Isso já havia acontecido tantas vezes naquele ano, que o Caio perdera as contas.
Sentando na poltrona do ônibus, ele respirava aliviado porque sabia que havia conseguido. Colocando discretamente os fones de ouvido, procurou sua playlist favorita: Imagine Dragons. Ao som de "One Hand In My Pocket", o dia despontava tímido, o frio dominava o ambiente e as gotas de uma chuva suave caíam e deslizavam na janela. Caio olhava tudo aquilo e se sentia bem. Lembrava do papo com a Talita na noite anterior, ria sozinho lembrando que ela não o deixava em paz. Heitor, seu amigo, chamava-o no chat, desafiando-o para um jogo após a aula, lembrando que precisaria ajudar seu pai, ele ainda assim concordou, pois era competitivo e adorava ser desafiado.
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A cama convidava para mais 5 minutos, porém seria impossível ficar deitada por mais tempo, era o primeiro dia na escola nova; Laura precisava escolher a roupa, alimentar a Meg e preparar o café; mas estava chovendo e isso piorava tudo. A vontade de permanecer em casa gritava dentro dela. Esse é o problema de ser adulto. Você sempre quer mais 5 minutos na cama, mais um dia de folga, entretanto, a palavra "compromisso", faz essas opções serem apenas desejos utópicos.
Antes de correr para o banho, ela ligava a cafeteira, pendurava a roupa sobre a porta do guarda-roupa e sorria contente com sua escolha.
Após um banho rápido, enquanto tomava um gole do café, penteava seus cabelos negros. Optou por um sobretudo vermelho, meias pretas e uma bota cano curto. Não queria de modo algum chamar atenção, mas estava frio e necessitava de algo quente e arrumado. Vestida, pegou seu material, guarda-chuva e saiu para o novo emprego.
Andava na rua e admirava cada detalhe, pois há muito tempo não saía pelas ruas da cidade. Mães levavam seus filhos à escola, funcionários varriam as calçadas dos estabelecimentos comerciais, o som das buzinas dos carros. "Interessante", ela pensava. Tudo parecia ter uma beleza singular naquele dia. A passos largos, ela se aproximava da escola nova.
Ao chegar, foi recebida pela coordenadora, que cordialmente lhe explicou os detalhes acerca do trabalho com as turmas, falou sobre questões salariais e, em seguida, levou Laura até a sua primeira turma. Após uma breve apresentação, a coordenadora saiu e deixou Laura à vontade com sua primeira turma do dia. Laura, um pouco nervosa, não era sua primeira vez, tinha alguns anos de experiência, no entanto, algo a intimidava naquela sala. Apenas 8 alunos, todos a observavam dos pés a cabeça e isso deixava-lhe um pouco desconcertada.
Caio havia chegado na sala cedo e contemplava com olhos tímidos, aquela figura emblemática que acabara de entrar na sala. Ele analisava-a cuidadosamente desde os gestos até o tom de voz, que parecia nervoso, segundo sua percepção.
Laura buscou conhecer a todos os presentes, por isso começaram uma apresentação curta. Ela olhava fixamente para cada um que iniciava uma fala.
De repente, ela sentiu que estava sendo observada, quando olhou para sua esquerda percebeu que olhos castanhos seguiam seus pequenos gestos e pareciam rir silenciosamente. Sem graça, ela dirigiu-se ao Caio, quebrando o jogo particular que ele jogava desde que ela entrara na sala.
- Olá, você não me é estranho, mas posso estar enganada. Qual é o seu nome?
- Bom, acho que não nos conhecemos. Eu sou o Caio. - Respondeu ele, um pouco tímido.
Não trocaram muitas palavras, no entanto, Laura sentia que havia algo especial naqueles olhos tímidos que a fitavam.
A aula acabou. Ela dirigiu-se às outras turmas, procurando encontrar sua próxima parada.
Na hora do intervalo, todos os estudantes saíram gritando e brincando de modo bastante peculiar. Laura, que não havia comido nada pela manhã, apenas bebericado seu café, resolveu comprar um lanche e sentar no pátio. Todos os meninos brincavam, pareciam se divertir bastante. Como boa observadora das coisas simples da vida, Laura sorria sozinha. Caio conversava com os meninos e, como bom estudioso do comportamento humano, analisava cada detalhe em Laura, com certa distância, pois sempre buscava a discrição...
Ela não sabia que era observada, mas vez por outra olhava para Caio, pois algo nele chamava sua atenção, ela descobriria do que se tratava, estava decidida.
Com o fim do expediente, ela se sentia motivada. O primeiro dia fora animador e o fato de ter um olhar intrigante observando-a, deixou a jovem ansiosa pelo dia seguinte, porque buscaria descobrir que imã estava lhe obrigando a olhar para o Caio.
Ele chegou em casa, intrigado com a nova professora. "Ela é um tipo estranho", pensava. Agora sentia-se desafiado a descobrir mais a respeito da nova figura que o observava no intervalo e colocaria em prática suas táticas de detetive.
Naquela noite, uma energia e forte ansiedade dominava Laura, enquanto preparava suas próximas aulas, ouvia Imagine Dragons e sabia que a dor era responsável por fazê-la acreditar que o amanhã seria ainda melhor.
Ambos adormeceram ouvindo...Believer