quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Amanhã é 23






Amanhã é 23, sim, 23 de janeiro de 2017. O tempo, carrasco dos que esperam, é igualmente cruel quando se encarrega de levar consigo tudo aquilo que mais almejamos. 
São 22 horas, estou no meu quarto, desde o dia 1 que eu planejava fazer minha lista de  objetivos para ano novo, mas não consigo fazer nada. Estou bloqueada para sonhos e escritas. Estou desnorteada desde o dia que ele entrou em contato comigo dizendo que passaria suas férias em minha cidade. Estou namorando, ele não deveria ter me falado. Não sabia quais eram seus planos e perdi todos os meus a partir daquele som de notificação que indicava a sua chegada iminente. 
O Thomas e eu nos conhecemos há 6 anos atrás. Morando no interior, eu saí de casa para tentar a vida na cidade; meus sonhos? Ser independente, morar sozinha, ter meu próprio dinheiro, fazer faculdade... ser feliz.  Tive que me habituar a muitas coisas, consegui um emprego de balconista do restaurante do Joel, ele tornou- se uma espécie de pai para mim. 
Era 2009 quando comecei meus serviços no "Coma" do Joel, esforçada, eu dava o meu melhor, era constantemente humilhada por clientes e colegas de trabalho que, pareciam não suportar a minha presença. Eu não era uma garota má, era tão determinada e focada no serviço que não perdia tempo com conversinhas ou qualquer problema. No grupo de colegas havia duas garotas que eram legais comigo, haviam iniciado no trabalho um mês após mim; Paula e Alice, duas loucas, muito divertidas, que me ensiram muito.
2010 chegou, eu estava namorando um cara que conheci numa noite de folga.  Alice estava solteira e reclamando que não conseguia ninguém, Paula estava noiva e, de todas nós, era a mais bem- sucedida do grupo. Ela, como boa amiga, resolveu dar um jeito naquela situação da Alie. 
Seu primo Thomas, havia chegado a cidade e estava solteiro, logo, seria uma ótima opção para a Alie que não parava de reclamar da sua condição civil. 
Durante uma tarde de verão, ele entrou no restaurante e foi alegremente cumprimentado pela prima, que em saiu gritando pela Alice, queria apresentá-la a qualquer custo. 
Ela foi na direção do rapaz.  Como o restaurante estava vazio eu pude contemplar a situação. Ele estava visivelmente constrangido. Era moreno, magro, uma pele litorânea, olhos firmes, pequenos, sorriso fácil e lindo. Eu estava namorando, por isso não ousei chegar muito perto para não correr o risco de confundir as coisas. Mas a Paula gritou:
- Ana, vem conhecer meu primo gato! 
Eu, não mais constrangida que ele, fui em sua direção. 
- Oi, então você é o primo dessa louca?  Falei tentando quebrar o clime pesado. Ele sorriu e respondeu que sim. A ceninha acabou, ele sumiu e eu não ouvi falar dele por longos anos e, francamente, eu nem sequer lembrava de sua existência. 
O tempo passou, eu entrei na faculdade,  a Paula casou-se, a Alice mudou de emprego e tudo parecia bem. Um certo dia de 2012, fui abordada pela Paula que gritava meu nome.

- Ana, oi! Escuta, você lembra do meu primo Thomas? 
-Não sei, acho que não. 
- Claro que lembra, eu o apresentei a Alice. - disse ela bastante segura. 
-Ah, sei. O que tem ele? - perguntei.
-Ele quer seu contato do Facebook. Pode ser? 
- E ele lembra de mim?
Questionei meio descrente. 
-Claro! Pode sim. 
Respondi apressada, pois precisava voltar ao trabalho. E na mesma noite ele puxou papo. Eu estava solteira e fiquei muito animada com o papo intelectual do jovem. 
Passamos a nos falar diariamente. Eu chegava da faculdade e corria ao notebook.  Era prazeroso trocar ideias com alguém tão parecido comigo e tão gato. Quase 3 anos de conversas pelo Facebook. 
Os anos foram passando, certa noite,  ele me ligou pela primeira vez. Aquela voz  me derrubou.  Na segunda visita dele à minha cidade, nos encontramos. Estávamos ansiosos pelo encontro. A cada conversa, cada olhar, nós sentíamos algo diferente. Ele não ficou muito tempo. No retorno dele à sua terra natal ficou bem claro que algo havia mudado, era tanta saudade. Então ele passou a me ligar com mais frequência. Trocávamos suspiros. Os meses foram passando e nos declaramos. Ele estava relutante em admitir o sentimento, mas seus esforços para falar comigo aliados aos  suspiros deixaram claro. 
Passamos a fazer planos, promessas. Mas nunca usamos a frase " eu te amo", embora isso estivesse claro nas atitudes. Os anos passaram e as conversas foram se intensificando, no entanto, algo impedia que déssemos um passo mais profundo. Nossas convicções religiosas e doutrinárias impediam nossa relação. Suspirávamos, parávamos de nos falar, não resistíamos, chorávamos e tudo voltava a ficar como antes. O Ronald surgiu nesse tempo de confusão entre nós dois, que não conseguíamos chegar a um acordo para ficarmos juntos. Nossos pontos divergiam muito. Ronald, muito educado, sensível e apaixonado por mim, conseguiu me conquistar, aceitei assumir um compromisso com ele. O que deveria me afastar do amor que sentia pelo Thomas. Nosso amor impossível não contava sequer com um beijo, ou um toque suave. Nunca nos tocamos. 
Dia 16 de janeiro, 2017 começou com o retorno dele, exatamente nesta data. No primeiro dia já nos vimos. Ele veio com um amigo e juntos, os três, conversamos horas e horas. Volta e meia ele me olhava no fundo dos olhos. Meu coração arrebentava no peito.

Fui para casa morrendo. Sentindo que tudo o que havia acontecido entre nós estava ainda mais vivo. Ao chegar em casa, ele puxou conversa pelo WhatsApp lá decidimos que nos evitaríamos. Não iríamos nos encontrar mais. Acordo firmado. A semana passou rapidamente. Todos os dias ele estava em meus pensamentos. Pedi o sono, chorei, tudo estava fora de controle e ele, fora do meu alcance. 
O dia 22, um domingo de sol, começamos a conversar por volta as 10 da manhã. A cada palavra eu chorava descontroladamente. Ele iria embora no dia seguinte e não nos veríamos mais. Esse era o plano. Na conversa ele me perguntou o que eu faria quando ele partisse. Eu apenas disse " vou ficar noiva e me casar" , ele pareceu ficar de coração partido, porém não mais que o meu. Decidi enviar uma canção, uma que marcou nossa história, em seguida pedi " me fala qualquer coisa quando você ouvir. Qualquer. " Ele disse:  "eu te amei". As minha lágrimas rolaram.
Feridos, decidimos nos ver outra vez, a última vez. Marcamos para às 17 horas. O combinado era: Sairíamos para caminhar, nos olharíamos nos olhos e juntos contemplaríamos o pôr do sol. E este, levaria consigo nossos planos, nossas lágrimas, nosso amor. Ambos seguirímos nossas vidas.

  
Às 17 horas  em ponto, nos encontramos. O Sol já riscava o horizonte com linhas de roxo e azul... Linhas bem definidas surgiam no Céu. 
Caminhamos calmamente, só nós dois. Na trilha havia algumas pedras  favorecendo que sentássemos. Paramos, nos olhamos nos olhos. O vento frio do crepúsculo soprava sobre nós. Nossos corpos tremiam, queria acreditar que era o frio, porém era mais que isso. Estar ao lado dele provocava uma sensação inexplicável. Nosso amor ecoava. Gritava com o vento, reluzia nos relâmpagos que cortavam ao longe no horizonte.  Chorávamos por dentro. O Sol soltou seu último brilho, os raios deixavam uma marca do Grande Artista. Nos olhamos...lembramos da partida do nosso amor junto com ele. Enquanto caía a noite, os nossos olhos flamejantes se tocavam. Eu respirava com dificuldade, enquanto ele me tomava em seus braços apenas com olhar. Pude sentir o toque macio dos seus lábios...
Estou agora deitada, chove um pouco lá fora...janeiro escorre como a água por entre os meus dedos. E eu só consigo lembrar daquele último pôr do sol, daqueles olhos, daquele amor.

Logo cedo fui questionada por uma amiga sobre o que seria o verdadeiro amor. No momento eu não soube responder. Falei qualquer coisa para escapar da situação.  Hoje, enquanto ouço músicas aleatórias porque não posso ouvir as nossas. Estou presa a um universo paralelo e posso definir o amor, ao menos o que sinto: o Amor é uma porta aberta com vista para o pôr do sol, ele contém toda a beleza do sublime crepúsculo da natureza e, assim como o pôr do sol, o Amor é infinito, pois diariamente, e de diversas formas,  ele se renova.
"Amanhã é 23...são oito dias para o fim do mês...faz tanto tempo que eu não te vejo, queria o teu beijo outra vez."